O terceiro setor tem demonstrado ter papel crucial nos esforços de desenvolvimento global. As organizações sem fins lucrativos, em geral, movidas por um forte sentido de responsabilidade social e compromisso com mudanças positivas, têm gerado impacto significativo na construção de um mundo melhor. Ocupam papel fundamental na promoção do progresso sustentável, contrastando, inclusive, em resultados econômicos, com outros setores da economia que recebem diversos incentivos e que pouco contribuem para o PIB.
Importante ressaltar que, apenas no ano 2022, o terceiro setor movimentou 400 bilhões de reais, correspondendo a 3,93% do Produto Interno Bruto (PIB) da economia brasileira, com expectativas chegar a 4,27% (1) em 2024, e é responsável pela contratação de 5,88% do total dos trabalhadores brasileiros. A criação, desenvolvimento e profissionalização das instituições sem fins lucrativos é crescente nas últimas três décadas.
Esses dados econômicos e os impactos sociais do setor demonstram a necessidade de atenção com a estratégia jurídica das instituições sem fins lucrativos para mitigação de riscos e ampliação de resultados. As instituições sem fins lucrativos têm como principal objetivo promover desenvolvimento em diversas áreas, visando o bem-estar social, a proteção ambiental, a promoção da cultura, a sustentabilidade, a regeneração da biodiversidade, entre outras tão importantes. Trata-se de setor de grande relevância no mundo todo, que pressupõe cuidados especiais, posto que atuam pelo interesse público e lidam com questões complexas que os governos muitas vezes em anos não conseguem resolver.
A estratégia jurídica pode desempenhar papel crucial em pelo menos três áreas cruciais: constituição da instituição, gestão e governança, e sustentabilidade dessas organizações. No início, a estratégia jurídica para constituição garante não apenas que a instituição atenda a legislação vigente, mas também possibilita a escolha da estrutura formal apropriada. Cada estrutura legal, seja fundação, associação ou cooperativa, possui requisitos específicos e implicações legais distintas, e a escolha correta pode influenciar significativamente na capacidade da instituição em cumprir sua missão, gerir seus recursos e atingir seus objetivos sociais.
Além disso, uma boa estratégia jurídica ajuda a definir claramente os objetivos e a missão da organização, facilitando sua adequação à programas e finalidades específicas, bem como o acesso à recursos financeiros e materiais para sua manutenção e sustentabilidade. É importante delinear os direitos e responsabilidades dos membros e diretores, estabelecendo, desta forma, uma base sólida para a governança e a transparência, elementos essenciais para a credibilidade e a eficácia da entidade no longo prazo (2).
A organização deve estar sempre em conformidade com a legislação aplicável, e quando lidam com temas sociais relevantes frequentemente enfrentam um ambiente regulatório complexo e em constante mudança. A conformidade com as leis ambientais, fiscais e trabalhistas é crucial para evitar penalidades e para manter a reputação da instituição.
Na gestão cotidiana das instituições do terceiro setor, a estratégia jurídica também desempenha papel vital. Isso inclui a elaboração e revisão de contratos, a gestão de riscos e a garantia de que todas as operações estejam em conformidade com as regulamentações específicas de sua atividade, minimizando riscos e maximizando a eficiência.
Muitas instituições dependem de doações, subsídios e parcerias com o setor público e privado. A capacidade de negociar e redigir acordos de financiamento que protejam os interesses da organização e não prejudiquem a entrega da causa que defendem é fundamental para garantir a continuidade das suas operações. Além disso, em um contexto em que a transparência e a prestação de contas são cada vez mais valorizadas, uma boa estratégia jurídica pode ajudar a manter a confiança dos doadores, parceiros e do público em geral, através da criação de programas de governança robustos. Isso é crucial para a sustentabilidade financeira e operacional da organização no longo prazo. (3)
A sobrevivência longínqua das instituições do terceiro setor, também depende de uma estratégia jurídica robusta. Em um cenário global de crescente preocupação com as mudanças climáticas, essas instituições muitas vezes estão na linha de frente das campanhas por políticas mais rígidas de proteção ambiental e de projetos de mitigação e adaptação às mudanças climáticas. O mesmo ocorre com as instituições que estão conectadas com assuntos sociais como a pobreza, desigualdade social e reintegração humana.
As organizações do terceiro setor precisam estar preparadas para lidar com litígios e outras questões legais que possam surgir no curso de suas atividades. Ter uma estratégia jurídica sólida, pode ajudar a instituição a evitar ações judiciais indesejáveis, a proteger sua propriedade intelectual e a garantir que suas iniciativas sejam legalmente defensáveis em âmbitos mais sensíveis onde não há um posicionamento social já definido.
Em suma, a estratégia jurídica é um componente único que deve ser levado em consideração nos momentos de constituição, gestão, comunicação e sobrevivência das instituições do terceiro setor. Ela não só garante a conformidade legal e a gestão eficaz, mas também fortalece a capacidade dessas organizações de alcançar seus objetivos e de se adaptarem a um ambiente regulatório em constante mudança. Ao alinhar a estratégia jurídica com a missão e os objetivos da instituição, é possível criar uma base sólida para um impacto duradouro e positivo no enfrentamento dos desafios que estas se destinam resolver. ______________________________________________________________
1 – Instituto ACP, Instituto Phi, Fundação José Luiz Egydio Setúbal, Movimento Bem Maior, Sitawi Finanças do Bem e Tereza Bracher 2 – https://www.tandfonline.com/doi/full/10.1080/09615768.2023.2283235 3 – Improving and measuring transparency in NGOs: A disclosure index for activities and projects – https://onlinelibrary.wiley.com/doi/abs/10.1002/nml.21298